Segue um artigo que fiz pro caderno Vida & Arte
sobre a história do Hip Hop na minha vida.
Deve ser publicado na semana que vem,
de acordo com a matéria que o caderno
está promoverá com o movimento.
"É NÓIS MERMO, VAGABUNDO!"
Por Guabiras
"Escutar o Hip Hop é coisa normal
Entender o Hip Hopé onde está o mal" (Código 13)
Dos diversos gêneros musicais que cultuo,
o rap é o mais intenso graças à minha
memória de cassaco que guarda muito bem
os mínimos detalhes que começaram numa
pacata Manibura de 1985.
Vamos lembrar pérolas?
Pois bem! Até então, a música brasileira
sofria um bombardeio nunca antes visto vindo
de um mundo fonográfico pós-punk e
"seja bem-vindo" new wave.
Eu nem tinha endurecido a medula,
mas lembro bem que, pra ser mocinho,
tinha que passar gel no cabelo estaqueado.
Blééé...
Até então, só Afrika Baambaata e Kurtis Blow é
quem havia entrado em terras brasileiras,
devagarinho, rasteiro, de "piano" entre um aperto e outro.
Mas seus trajes eram próprios e suas caras
eram emburradas, então rapidinho os pulmões
de meu irmão e de toda a rua Caiado de Castro
encheram de ar.
Os primeiros scratches que ouvi saíram
de um tal de LL Cool J.
Vinil bonito, ele de touca e blusão,
todo paludo em cima do capô de um carro.
Em cima, um nome amarelo destacado: BAD.
Traduzir o inglês, então, em 1986 era mesmo
que decifrar os códigos da Vinci.
Mas deciframos. Bad é Mal! Grande descoberta!
É legal ser mal!
Não demorou muito pra que, na outra semana,
meu mano pegasse todo seu ordenado e comprasse
o disco de ninguém menos que um tal de BEASTIE BOYS,
outra capa bacana, um avião feito de lápis de cera se
esbarrando num rochedo.
Euforia total e, daí pra frente, ninguém
mais seria o mesmo. Nem os ouvidos de nossas tias.
Festas de fim de ano, em toda Água Fria,
o que se ouvia no derradeiro final da década de 80
era Fat Boys, Run DMC, Kool Moe Dee, Salt' n Pape,
Mantronix...
Ah, Mantronix! Só de lembrar já me arrupio todo!
Mas peraí! Ninguém sabe píula nenhuma de inglês,
então como devemos chamar cada faixa?
Bom, que tal "melô"?Melô do Batman, Melô do relógio,
Melô da macumba, Melô do piano, Melô da Zorra,
Melô do Bêbado, Melô do Pichador...
Logo as rádios tomaram de assalto suas programações rap
e em tudo que era praça da cidade, onde quer que a gente
se virasse havia elementos imitando robô e ciscando
no chão tal e qual galinha no terreiro.
Foi aí que a ficha caiu! Se eles fazem, porque nós não?
Em Sampa,começaram Thaíde & DJ Hum, MC Jack e Código 13.
Era o Hip Hop Cultura de Rua!
Primeiro registro nacional e portas pra
série Funk Brasil que, sob o comando de DJ Marlboro,
teve participações de Regina Casé e Dercy Gonçalves.
Tudo isso o asilado do meu irmão ia arquivando,
seja em discos de verdade, embalados em sacos do Romcy,
seja em fitinhas cassetes, gravadas em programas
apresentados por ninguém menos que (plim!) Paulinho Leme!
Se o passado condena um, outros como Robson Nolasco
é quem comandavam o microfone.
Na altura do campeonato, ah, já sabiamos o que era cada um:
break, hip hop e o rap, coisa que embaralhávamos sem dó.
Só resumindo: break é a dança, hip hop o movimento geral,
desde vocabulário à carteirinha de sócio.
E o rap é o budejo, música e verbo! Foi nessa discussão
que chegamos a definir também que dentro do próprio
gênero existia o lado do bem e o lado do mal.
O mal seria apenas o o rap mais seco, mais desbocado
e que "peitava os ômi", do tipo Ice T e Public Enemy.
Só que esse caminho meio que perdeu a noção do leriado,
ganhou gente realmente ruim (quem matou 2-Pac? Jam Master Jay?)
e atualmente consome a cena - fazendo uma música
por ano e enchendo o casaco de verdinhas.
Aqui no Brasil,
pra se limpar com as "peias" que iam surgindo nos bailes,
os verdadeiros malfeitores da indústria passaram a apostar
no rap açucarado, do tipo Claudinho & Buchecha e MC Marcinho.
Divisões à parte, o funk assume o requebrado e
Fernanda Abreu é funkeira. Argh!
Até um tal de Gabriel, o Pensador, fura o cerco!
Pobre "Tonheta"! Até a Feira do Acarí cai de movimento.
Nessa esfriada, só os Racionais MC's é que vão
amadurecendo e amadurecendo...
chega o meu primeiro sobrinho e daí ganho de lambuja
o acervo que até então eram os melhores que existiam.
E foi pelo rap que conheci o rock, mesmo que as
capas do Iron Maiden tenham me ajudado em alguma coisa.
Cypress Hill e Rage Against the Machine pertencem a esse lado.
Na base da distorção e dos pedais, quem quis viver de rap
teve que usar uma criatividade mais exigente, como
fizeram Black Alien e Chico Science,
ou como acertou o Rappin' Hood, colocando um
sambinha por baixo, depois arrastado por Marcelo D2
numa incrível cara de pau. Atualmente, quem juntar
rap com guitarras não é rapper, é vocalista de Nu-Metal.
É o rap com evoluções e evoluções, capaz de infraquecer,
mas não de morrer, onde uns copiam, outros só ouvem,
alguns revolucionam. Há até os que frescam, como fresca
a Best Girl
É o rap, esse intrigante e ácido gênero da música.
É o rap que você odeia adoidado, mas basta ouvir
umas batidinhas pro seu pé começar a balançar!
E nem precisa ser preto ou favelado!!!
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